sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Défice à portuguesa

Contam-se dois dias, apenas, para os eleitores portugueses escolherem o novo primeiro-ministro de Portugal e que será eleito na sequência destas duas semanas de campanha que considero passarem ao lado dos verdadeiros problemas do país e a roçar a falta de respeito pelo estado de miséria em que nos encontramos e que é substancialmente agravado quando olhamos para o futuro dos nossos indicadores económicos e fiscais. Um desses indicadores é a tão temida carga fiscal (impostos)!

Espanta-me, neste país, que políticos (alguns profissionais) que se dizem capazes e com todas as condições para nos governar, tenham andado a zaragatear uns com os outros acerca da retoma da crise mundial que nos atravessou este ano. Dois pontos:

1. Nenhum dos partidos, onde existe a forte possibilidade de governar em coligação, se referiu à nossa crise estrutural, a nossa crise “mais antiga”.

2. A demagogia e o engano no debate acerca da redução da carga fiscal nestes próximos anos, o que constituiu um verdadeiro absurdo, próprio de políticas radicais de esquerda e de indivíduos que, conscientes das suas palavras, mentem descaradamente em campanha eleitoral.

É profundamente inconcebível que alguns andem a prometer baixar impostos tendo em conta o estado da dívida pública e o défice financeiro que atravessamos neste período, e não só! É que daqui a poucos meses teremos a UE à porta a mandar-nos “apertar o cinto” (reduzir o défice). É óbvio que para promover o desenvolvimento económico, o país tem de reduzir a complexidade e volume fiscal que, neste momento, é aplicado em Portugal. No entanto, perante uma situação de descalabro das contas públicas, apenas se oferece ao Estado três soluções de resposta às restrições impostas pela UE: aumento da receita, redução da despesa ou endividamento (embora mais condicionado e com juros maiores derivados do nível de risco que Portugal já representa para as instituições financeiras mundiais e ainda aos condicionamentos do acesso ao crédito nestes tempos de retracção).

Aumento da receita. No nosso país não estão reunidas as condições necessárias para um aumento da receita por via do desenvolvimento económico, já que os factores geográficos, a burocracia e a falta de flexibilidade laboral continuam a comprometer o desenvolvimento empresarial e a competitividade nacional. A incapacidade estrutural permanece. Neste sentido, o único veículo de aumento da receita passa pelo incremento dos impostos.

Redução da despesa. Em Portugal, mais de 80% das despesas do Estado são despesas sociais (salários, pensões, subsídios de doença e desemprego, etc), o que constituiu, portanto, um caminho bastante difícil de envergar pelos diversos governos, já que compromete a paz social e os tão indispensáveis votos!

Endividamento. A grande paixão portuguesa! O endividamento do Estado em % do PIB supera já os 100%, havendo, deste modo, grande necessidade de contenção neste ponto já que pagamos cada vez mais juros e estamos cada vez mais degradados economicamente.
Consequentemente, as avaliações de rating são cada vez piores para nós e o crédito encontra-se numa grande fase de retracção, ameaçado pela recente crise financeira.

Torna-se fundamental a mentalização de que parece inevitável um aumento de impostos (que já estão ao nível dos praticados no mercado alemão, a maior economia da Europa) ou, pelo menos, a manutenção daquilo que já está, pois um desagravamento parece quase impossível tendo em conta que teremos de reduzir o défice (receita-despesa) para os níveis exigidos pela UE e essa redução tem os seus caminhos óbvios.

A minha recomendação é que se tome coragem e sentido de Estado e se promova um pacto nacional de redução de salários na administração pública, aliado à redução de alguns benefícios sociais não tão decisivos como é o caso, por exemplo, do rendimento mínimo de inserção. Foi esta a solução optada pelo governo da Hungria e que permitiu, sem aumento de impostos, reduzir a o défice de 9 p.p. para os 3%, apesar de ser muito pouco popular. É uma medida que promove a economia, baixando os custos, e resolve grande parte do excesso de despesa ou a falta de receita associada ao défice financeiro.

Jorge Manuel Honório

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Factores do crescimento da economia portuguesa


No último artigo apresentei algumas notas acerca do que nos reservam os próximos anos se não forem radicalmente alteradas as políticas públicas. Recordo que as projecções da OCDE apontam para, nos próximos 10 anos, um crescimento médio do produto potencial de 0,7% - o mais baixo da zona.

A questão que se põe é a de saber quais os factores do crescimento e colocar no terreno técnico o debate ainda muito tributário da pura especulação ideológica; de forma simplista a Esquerda exige mais investimento público em infra-estruturas e educação e a Direita pede menos impostos e mais privatização.
O indicador relevante é a produtividade (valor acrescentado sobre o número de trabalhadores) e não o custo unitário do trabalho, indicador frequentemente utilizado em análises de curto prazo e de significado limitado e enganador, muitas vezes conducente a propostas de contenção salarial. Só a produtividade serve de referência para a medição da prosperidade, indicando o valor criado passível de distribuição pelos detentores dos factores de produção.Embora não haja consenso sobre os factores da produtividade e sua importância relativa, haverá que partir do conhecimento do que melhor se investiga sobre o assunto. Parece-me, assim, que devem ser seriamente ponderados e debatidos os seguintes factores.
Mercado interno e exportação. Devido à situação geográfica, o País está dependente da criação de um mercado interno de importância superior à esperada pela sua dimensão e a integração na UE. O País necessita de aumentar o poder de compra da população e de alargar as áreas de actuação da iniciativa privada, através da retracção do Estado em amplas áreas onde ainda é preponderante, entre as quais a educação deve ser sublinhada pelos substanciais ganhos de produtividade que podem ser obtidos.
Portugal exporta 40% da produção industrial contra 90% da Irlanda, 70% da Dinamarca e Áustria, 55% da Suécia, 50% da Finlândia. Estes valores reflectem a situação geográfica do País. A pressão e as políticas selectivas em favor do sector exportador que não tenham em conta este dado contribuirão para gerar distorções e situações artificiais desbarataras de recursos.
Políticas gerais não selectivas. As políticas selectivas, de sectores, países, são factores de distorções na alocação dos recursos e de ineficiências. Cerca de 2/3 dos ganhos de produtividade deve-se à eficiência (produtividade total dos factores); não importa apenas a acumulação de factores mas sobretudo a sua afectação eficiente. A falta de concorrência, a corrupção e as políticas selectivas têm aqui um papel negativo.
PME. A baixa produtividade deve-se em grande parte às diferenças de produtividade no interior do País, devido ao enorme peso das PME. A produtividade mais elevada é apanágio da grande empresa.Uma estrutura empresarial equilibrada, geradora e eficaz contém uma composição adequada de grandes, médias e pequenas empresas. No País, a presença de grandes empresas é muito pequena. O apoio especial às PME pode travar o seu crescimento. O importante é a mobilidade empresarial, propiciando o crescimento das pequenas empresas e o desafio às posições ocupadas pelos grandes incumbentes.Educação. O factor capital humano tem uma dimensão qualitativa importante, representada pelas habilitações da população. A duração da escolaridade obrigatória e a proporção da população com Ensino Superior, não são os indicadores que melhor explicam o crescimento da produtividade. O conhecimento efectivo da matemática e escolaridade generalizada nos grupos etários logo desde os 3 anos e até aos 15 anos são os indicadores educativos que melhor explicam o crescimento.
O indicador de eficiência das despesas de educação é o mais baixo da OCDE. A educação é mais ineficiente área de intervenção do Estado. Mesmo do ponto de vista puramente social, a ineficiência é evidente. Estudos recentes confirmam que a mobilidade social intergeracional no país é a pior da OCDE e não tem melhorado. A maior escolaridade não resultou em mobilidade social e empresarial. Os velhos mecanismos da reprodução social e económica tardam em ser quebrados.
O alargamento da escolaridade para os 12 anos e 18 de idade, ao dispersar recursos para uma área menos eficaz é um novo erro que se perfila. A melhoria do ensino até ao 9º anos - e aqui entre os 3 e os 10 anos - onde se estruturam as habilidades é a melhor política de educação para o crescimento e também a mais adequada para a redução das desigualdades sociais.
Inovação. Os indicadores da inovação estão estreitamente associados aos ganhos de produtividade. A participação dos detentores do grau de doutor no sistema produtivo quer como empresários quer como quadros superiores são um importante factor de inovação da estrutura empresarial. Apesar de um substancial recente crescimento o corpo de doutores no país está virado para si próprio e para o sistema de ensino: 85% dos doutores está no ensino contra 33% nos EUA e 13% na Alemanha.
Impostos e despesa pública. A despesa pública é o resultado da criação de riqueza e não o inverso. Não tem sido possível comprovar a influência negativa ou positiva das despesas públicas sobre o crescimento. Também não há evidência causal comprovada entre impostos em geral e crescimento, mas a estrutura tributária não é indiferente: os impostos que incidem sobre o rendimento são mais penalizadores do os impostos sobre o consumo. Mais importante que o nível da despesa e dos impostos é a distorção na estrutura das receitas e a ineficiência da despesa.
Licenciamentos e regulação. A regulação restritiva e os obstáculos ao licenciamento das actividades económicas são importante factor de crescimento e de produtividade. Portugal é um país altamente restritivo e moroso na área dos licenciamentos, tendo 127 países melhor posicionados. Estudos recentes, para os países da OCDE, mostram que as infra-estruturas físicas são responsáveis apenas por ¼ das demoras, devendo-se as restantes as aspectos burocráticos. Cada dia adicional de demora reduz o comércio internacional em 1,3%. Por sua vez foi possível estabelecer uma equivalência entre 1 dia de demora e 70 km de distância dos mercados.
Na regulação do mercado de produtos o país é também fortemente restritivo sobretudo na área do controle do Estado sobre as empresas onde ocupa a 3ª pior posição da OCDE.


Avelino de Jesus
Director do ISG - Instituto Superior de Gestão